“Adrenalina da emergência em vez das salas do hospital”, titula o Jornal de Notícias, na sua edição de 17 de janeiro. Trata-se de um trabalho sobre Richard Glied, médico e elemento do Corpo de Bombeiros de Pinhal Novo, de nacionalidade alemã.
Reproduzimos aqui a entrevista, da autoria do jornalista Paulo Morais.
“Em termos da qualidade de serviço prestado não encontro muitas diferenças, agora os meios é que não são semelhantes e, infelizmente, temos cá acidentes mais graves do que na Alemanha”.
Das palavras de Richard Glied, um médico alemão de 40 anos a residir em Portugal há pouco mais de seis meses, quando questionado sobre as diferenças que encontrou, a nível profissional, sobressai o termo “temos”, que é elucidativo da forma como absorveu em pleno a mudança radical na sua vida.
Mudança assumida, depois do Portugal das férias que foi conhecendo ao longo de 15 anos, em julho de 2003. Mas foi uma decisão bem pensada, até porque tem três filhos: “Eu sabia que havia falta de médicos, informei-me sobre as possibilidades de trabalhar em Portugal e foi complicado arranjar todos os papéis. Vim logo, até porque era a última oportunidade para o fazer, porque as crianças iam começar a escola”.
Anestesiologista e especialista de medicina intensiva, Richard Glied trabalha num hospital em Setúbal, mas a sua grande paixão são os bombeiros. Foi no Pinhal Novo, concelho de Palmela, onde optou por residir – dada a proximidade do local de trabalho e simultaneamente de Lisboa, onde as crianças frequentam a Escola Alemã – que tomou a iniciativa de se dirigir aos Bombeiros Voluntários, oferecendo os seus préstimos.
Tem dez anos de experiência como médico de emergência pré-hospitalar na Alemanha, onde trabalhou como membro de uma equipa numa viatura e num helicóptero, e é bombeiro há oito. A corporação não se fez rogada, até porque Richard Glied é de trato fácil, e hoje está já equiparado a adjunto do comando, como médico.
Richard Glied fala com entusiasmo da sua nova vida, que sofrerá agora mais uma alteração, uma vez que vai trabalhar como profissional numa viatura do INEM. E aí, mais do que no hospital, sente-se que está no seu meio natural. “Prefiro este tipo de trabalho, é mais necessário, pois em Portugal falta este tipo de especialistas. É muito importante fazer a estabilização e um primeiro tratamento ainda na rua, para evitar que as vítimas sofram complicações futuras”, explica. Atuar no local do acidente permite ganhar tempo.
Projetos
Como não é homem para estar parado, está também a desenvolver alguns projetos com os Bombeiros de Pinhal Novo, particularmente ao nível de acidentes com várias vítimas. Em Portugal, refere, “não há uma coisa bem estruturada a este nível”. O projeto assenta no “aproveitamento de uma unidade de triagem, acrescentando-lhe mais meios”. A viatura irá funcionar em conjunto com outras duas, uma de gestão e outra rápida, para que Richard Glied se possa deslocar. Os Voluntários de Pinhal Novo vão procurar obter o apoio do INEM para esse projeto.
Por outro lado, o médico alemão, oriundo da Baixa Saxónia, está a ajudar a corporação a preparar a parte documental para a triagem das vítimas, o que é feito através de um modelo alemão, traduzido para o efeito. É que “há falta deste tipo de apoios de gestão, quando há muitas vítimas”.
Realizado profissionalmente, Richard Glied também não tem queixas a nível pessoal. “Gosto de viver e trabalhar em Portugal”, diz, com um tom que não admite dúvidas. “O sítio onde trabalho é mais agradável do que na Alemanha, apesar de existirem diferenças em termos de pontualidade e de organização de trabalho”. No entanto, não lhe custou “nada” habituar-se a viver aqui: “Fui muito bem recebido pelas pessoas e pelos bombeiros, apesar de não conhecer ninguém quando cá cheguei”.
O médico alemão que escolheu Portugal revela ainda outra diferença entre os dois países: “Ganho mais do que na Alemanha, mas a vida aqui é mais cara”. Nada que o faça arrepender-se da opção que tomou.
Paulo Morais, JN

