A maioria dos inquiridos, no âmbito de um estudo sobre a identidade social de Pinhal Novo, realizado por uma investigadora polaca, elege a Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Pinhal Novo como a instituição mais importante da vila.
O ponto de partida foi logo interessante. Uma autora de nacionalidade polaca, a residir há alguns anos em Pinhal Novo, desenvolveu um estudo sociológico sobre a vila, no âmbito do projeto europeu “Capital do Futuro”, que resultou no livro intitulado “Culturas Habitadas. Modos de ser e ver. O caso de Pinhal Novo”. A obra foi editada em versão bilingue (polaco e português), no final de 2005, pela Associação Juvenil “Odisseia”. A investigadora chama-se Aleksandra Chomicz e nela reside a maior lacuna do livro: a de nada revelar sobre a sua autora.
A publicação revela, todavia, visões curiosas, polémicas e, às vezes, antagónicas sobre a perceção que os pinhalnovenses têm da sua localidade, «através do buraco da fechadura». As opiniões foram recolhidas através de um inquérito, realizado entre maio e julho de 2005, em vários locais de Pinhal Novo (incluindo o quartel-sede dos Bombeiros Voluntários), que acabou por abranger 238 habitantes. Simultaneamente, a autora realizou cinco entrevistas individuais a residentes na vila, pré-selecionados em função da sua intervenção pública (Álvaro Amaro, Presidente da Junta de Freguesia de Pinhal Novo, foi um dos entrevistados) ou cultural. É a autora, desde logo, quem alerta para «o subjetivismo e relativismo das visões apresentadas nas entrevistas, as quais constituem só algumas das possíveis críticas e reflexões sobre as temáticas apresentadas».
Mas foi assim que Aleksandra Chomicz descobriu que os Bombeiros Voluntários de Pinhal Novo surgem à cabeça da lista das instituições locais consideradas mais importantes, pelos inquiridos. «A falta de hospital e outros órgãos de primeiros socorros abertos durante 24 horas, aliada à própria dimensão tradicional e histórica dos Bombeiros Voluntários, reforça ainda mais a sua posição especial e específica na vila», explica a investigadora. Só depois dos Bombeiros, aparecem referenciadas a Biblioteca Municipal e a Junta de Freguesia.
Outra conclusão interessante deste estudo: o motivo ferroviário assume-se como o símbolo mais relevante da identidade pinhalnovense, seguindo-se, nas respostas ao inquérito, a referência a José Maria dos Santos e aos pinheiros. É também o grande agricultor a personalidade referenciada como a mais importante para a identidade da vila. Logo depois é enunciado um antigo presidente da Direção dos Bombeiros (1969, 1970, 1971), o médico Manuel Veríssimo da Silva.
Neste domínio, é curioso que também tenham sido assinaladas personagens com um perfil marcado por «traços de irrealidade», mas que a autora considera terem «um lugar específico na construção do imaginário e memória coletiva de Pinhal Novo», como é o caso do popular José Lopa. Chomicz realça o facto deste nome ter sido mais citado pelos inquiridos mais jovens, e explica: «O seu [de José Lopa] comportamento e modo de estar desviado dos hábitos e normas sociais informalmente estabelecidos e aceites pela sociedade, concentra a atenção social, pertencendo, assim, à imagem do lugar por um motivo original e carácter próprio».
Também no que se refere à oferta cultural da vila, o papel dos Bombeiros Voluntários de Pinhal Novo é mencionado no estudo, por a sua sede dispor de um dos principais locais – o salão – destinados a acontecimentos culturais e artísticos.
”Convite para a conversa…”
“O desenvolvimento do Pinhal Novo está sempre relacionado com as vias de comunicação. Ninguém vinha para aqui morar, se não tivesse acessos para outros sítios onde trabalha. (…) há vida própria não só nas comunidades rurais em torno da grande urbe, mas dentro da urbe também há espaços, que não estão fechados naturalmente, as pessoas que vivem nesses locais não vêm apenas cá dormir… vivem ali, vão aos cafés, saem com os seus filhos, levam-nos à escola, convivem…” (Álvaro Amaro, presidente da Junta de Freguesia de Pinhal Novo)
“Nós não impomos naturalmente esta ideia de que há aqui uma cultura caramela ou uma cultura de gente ferroviária, porque tudo isso está hoje em grande mutação. Não impomos nada a ninguém. Os contributos das pessoas que para cá vêm morar são importantes para construir esta identidade, feita da multiplicidade ou da multiculturalidade (…)” (idem)
“(…) eu considero que, embora haja sempre muito trabalho para fazer, a oferta cultural de Pinhal Novo tem crescido e tem-se diversificado.” (idem)
“A identidade não é a reconstrução do passado, ela constrói-se também com o presente. Não é um objecto acabado. É uma representação simbólica, que cada um constrói, numa relação própria com o seu sítio, que nem sempre é mesma de pessoa para pessoa… (…) Há pessoas que têm a motivação para viver em Pinhal Novo e intervir. (…) Cada pessoa tem de facto uma relação de pertença. Para mim é satisfatório quando as pessoas dizem: “Eu moro em Pinhal Novo, eu sou de Pinhal Novo”. Há alguns anos atrás ninguém queria ser tratado por caramelo. Hoje, o caramelo tem uma conotação positiva, porque nos remete para um local em que as pessoas têm orgulho de pertencer (…)” (idem)
“A cultura Caramela é ligar o passado ao presente, para fazer o futuro; mas nesta terra com poucas referências percetíveis do passado, quando se vem de fora, a única ligação visível da qual tomamos logo conhecimento é a sopa Caramela, o resto fica uma interrogação.” (Joaquim António Gonçalves Borregana, artista plástico sob o nome Kim Prisu)
“Falta [na oferta cultural do Pinhal Novo] um museu sobre o desenvolvimento local. Este poderia dar-nos uma ideia da identidade desta localidade dita Caramela, que passou de um meio agrícola a um dormitório.” (idem)
“[Pinhal Novo] É uma vila que cresceu muito depressa nestes últimos anos, na qual o pouco que têm do passado se está a apagar. (…) As novas construções apresentam uma arquitetura sem caracterização própria, exemplo disso é a nova estação (…) Também o edifício do Santa Rosa se encontra ao abandono. Isto leva-nos a pensar que têm medo do passado e provavelmente deles próprios.” (idem)
“[Os símbolos atuais deste sítio] Eram os três pinheiros imponentes que se situavam mesmo no coração da vila” (idem)
“[Ser do Pinhal Novo] Significa ter sentimentos fortes para com a localidade e os habitantes (…)” (Flávio Andrade, fotojornalista)
“(…) uma das grandes lacunas do Pinhal Novo é a nível cultural. A cultura no e do Pinhal Novo é mais o café e a bebedeira social. O cinema na biblioteca, por exemplo, a maior parte das vezes está às moscas. A situação cultural é mais zero. Falta disponibilidade política para o fazer e vontade empresarial para pôr em prática. Pois, porque sem dinheiro não se pode fazer grande coisa. (…) O que falta concretamente é qualidade, porque ‘gosto’ ou ‘gostos’ existem, existe é um défice de bom gosto (…)” (idem)
“(…) o Pinhal Novo descaracterizou-se todo praticamente, primeiro pela grande e desenfreada construção imobiliária que ainda hoje se mantém, com a agravante da falta de critérios a nível estético desses mesmos imóveis (…)” (idem)
Fonte: Helena Rodrigues, c/ o especial obrigado a Flávio Andrade, pela oferta do livro


